No
mesmo sermão Antônio afirma que a “embriaguez
rouba o sentido” o que está de acordo com o cânone 13, que repreende os
sacerdotes que se entregam a bebedeira e por isso podem “perder o espírito e
aderir a paixões carnais”.
O
pecado da gula é um dos sete pecados capitais que recebeu mais ênfase no século
XIII
e era considerado um dos mais influentes sobre o corpo. Antônio, como outros
escritores cristãos, dedica partes de sua obra para criticar os religiosos que
se empanturravam e se embriagavam. Este pecado, para os pensadores cristãos do
período, vai ser o caminho maior para a luxúria, sendo indicado o consumo
comedido do álcool para que os religiosos não se deixassem levar pelos pecados
da carne.
Frei
Antônio deixa bem claro que a função do religioso é a orientação espiritual de
seus fiéis, e censura o cuidado destes para com os bens materiais, como podemos
ver no sermão do 5º Domingo de Pentecostes, quando o frade escreve que:
O Senhor roga ao prelado da sua
Igreja que a afaste um pouco da terra, isto é, que afaste do amor dos bens terrenos
os que foram confiados ao seu governo.
A
simonia, por exemplo, é, dentro deste âmbito das preocupações com as coisas
terrenas, uma das práticas que a Igreja tenta condenar e que para Antônio deixa
o sacerdote desabilitado a prestar os seus serviços espirituais, pois
Todo aquele que vender ou der o
espiritual ou anexo ao espiritual por oração ou dinheiro, por palavra ou dom,
por promessa ou oferta, por temor ou amor terno ou carnal, é simoníaco, e não
pode salvar-se, a não ser que renuncie e faça verdadeira penitência.
No Sermão do 9° Domingo de Pentecostes o frade usa o
livro de Provérbios para afirmar que a
simonia é como uma “mulher insensata e clamorosa, cheia de atrativos e
que nada sabe nem entende” (Prov. 9, 13-18), pois o simoníaco ao negociar o
espiritual é um insensato, uma vez que, para o frade o dom de Deus é gratuito.
Desta forma Antônio procura atacar de frente um dos graves problemas da Igreja
do período, reforçando a idéia de que a busca da correção dos maus hábitos dos
religiosos é a ferramenta mais efetiva para o combate aos hereges, já que para
o franciscano a Igreja se dissipava com a simonia.
Antônio escreve que: “vendem bois os que não
pregam por amor de Deus, mas por lucro temporal”, como assim fica claro
nos cânone 63, 64, 65 e 66 dos decretos do Concílio, que chama esta prática de
corrupção e ordena que nada pode ser pedido como permuta para o recebimento da
consagração dos bispos, da benção dos abades, da ordenação dos clérigos, da
entrada de irmãs nos mosteiros, para a nomeação de pároco, a sepultura dos
mortos e a benção aos parentes. Podemos observar, portanto, que o religioso
ideal para o teólogo tem que ser honesto e fiel à sua missão espiritual, que é
ministrar os sacramentos sem cobrar ou exigir nada em troca, preocupando-se
simplesmente em ser um transmissor das graças divinas, pois como ele mesmo
denuncia:
...os sacerdotes, antes, para falar
com mais verdade, os mercadores, estendem a rede da sua avareza para ajuntar
dinheiro, porque celebram missas por causa
de dinheiro. Se não cressem que iriam receber, de forma alguma
celebrariam missa. E assim um sacramento de salvação transforma-se em
instrumento de cobiça.
Outro
exemplo desta sua apreensão e de sua total aderência aos planos do Concílio
está no trecho em que ele exemplifica, condenando todos os mais importantes
religiosos da hierarquia da Igreja, dizendo que:
...Jesus Cristo,
hoje é vendido por negociantes Arcebispos e Bispos e demais prelados da Igreja.
Correm por aqui e por acolá, compram, vendem e revendem a verdade com mentiras
e oprimem a justiça com simonias. Os bufaneiros são os abades os priores
hipócritas e os falsos religiosos, que vendem pelo dinheiro do louvor humano as
falsas mercadorias da santidade alheia, sob pretexto da religião, na praça da
vaidade mundana.
Não
podemos esquecer que antes de entrar para a Ordem dos Frades Menores frei Antônio
viveu entre os Cônegos Regrantes em um dos mosteiros mais ricos de Portugal.
Onde com certeza para a manutenção padrão financeiro e das benesses dos
superiores a simonia devia estar presente. Outro fator importante é que a
Igreja de Roma vem sendo criticada em relação a sua ostentação conseguida
através da troca do sagrado por bens materiais, por diversos movimentos que
denominava de heréticos inclusive pelos franciscanos que também em seu modo de
vida religiosa são uma contestação a política da Santa Sé. Por tudo isso
Antônio procura orientar os religiosos incentivando-os a modificar estas
práticas.
Antônio
coloca, assim como alguns cânones de Latrão IV, que o principal cuidado do
sacerdote deve ser com a espiritualidade de seu rebanho, pois “os sacerdotes
são para vigiar”, sendo que para isso
eles devem conhecer “diligentemente o
aspecto do rebanho, isto é do seu súdito, se tem em sua fronte o tau da paixão
do senhor, recebido no batismo, ou então raspou e escreveu o sinal da besta”. A luta da Igreja contra os maus
hábitos dos religiosos tem neste discurso de Antônio um eco estrondoso, pois
para o maior controle dos fiéis estes religiosos deveriam, além de conhecê-los
e policiar a vida deles, ser um exemplo de fidelidade a Igreja e de testemunho
de fé.
Podemos
observar aqui a preocupação pastoral de Antônio ele não está querendo um
simples controle dos fiéis pela instituição, ele busca na verdade a salvação as
alunas através do esforço, que para ele é uma obrigação dos religiosos.
Outro
grande ponto para a demarcação do “sacerdote ideal” passa pela questão do matrimônio
dos sacerdotes e da situação dos filhos dos religiosos. Esta preocupação está
contida no seguinte trecho do sermão do 5º Domingo de Pentecostes:
A subsistência do sacerdote, com
efeito, hoje é a mistura de duas coisas, a palha do negócio terreno e o trigo
da oferta eclesiástica. Comem tal mistura os jumentinhos, isto é, os filhos dos
sacerdotes. Estes, com mulher e filhos, pretendem libertar o povo de Deus do
cativeiro do diabo; mas o senhor irá ao seu encontro e o matará, se não se
separarem da mulher e dos filhos.
Esta visão de Antônio tem como principal motivo o
uso, do dinheiro do dízimo e doações dadas a Igreja, por parte dos religiosos
para dar subsistência as suas esposas e filhos, uma vez que:
...com as oblações dos fiéis, por
eles esfolados , engordam seus jumentos, os filhinhos da focária
e os próprios filhos. Houve preceito na Lei de o bastardo, isto é, nascido de
meretriz, não entrar no templo do Senhor. E eis que filhos de meretrizes não só
entram, como também comem os bens da casa do Senhor.
Aqui,
mais uma vez, encontramos um Frei Antônio preocupado em pregar, isto é, propagar
as idéias de Latrão, desta vez seguindo o Decreto de número 14. Porém, neste
cânone, abre-se uma exceção para os religiosos em que o país de origem tenha
como costume o casamento dos sacerdotes. Estes, contudo, devem manter-se fiéis
a este matrimônio. Podemos observar então que, para o Frade, a continência e a
castidade, assim como para o Concílio, são importantíssimas para assumir suas
tarefas religiosas, pois:
Moisés, como diz no livro do Êxodo,
quando se dirigia com a mulher e os filhos para o Egito, a fim de libertar o
povo de Israel, um Anjo quis matá-lo; mas quando deixou a mulher e os filhos, o
Anjo abandonou-os...Estes (os prelados), com
mulher e filhos, pretendem libertar o povo de Deus do cativeiro do
diabo; mas o Senhor irá ao seu encontro e os matará, se não se separarem da
mulher e dos filhos.
Constatamos,
desta forma, que além de ser contrário ao matrimônio dos sacerdotes por achar
que uma família atrapalhava o bom trabalho missionário, o frade atribui aos
religiosos que tem filhos de casamentos legítimos ou não a culpa, em certo
grau, pela preocupação com a maior arrecadação de bens, uma vez que, precisa
cuidar de sua família. Denuncia também os maus hábitos nos mosteiros e
conventos e cita que empregadas mantém relações sexuais com os religiosos gerando
filhos que são chamados por ele de “jumentinhos”.